toalhas sujas do hotel. Eu não vi nada de estranho nisso, mas Rachel me mostrou onde
olhar, e reconheci o símbolo apagado cravado no metal.
“Não tem sido usada há um bom tempo,” disse Annabeth
“Eu tentei abrir a porta uma vez,” disse Rachel, “só por curiosidade. Só que a ferrugem
a emperrou.”
“Não.” Annabeth adiantou-se. “Só precisa do toque de um meio sangue.”
Como dito, no momento em que Annabeth pôs sua mão na marca, ela brilhou com um
tom azulado. A porta de metal abriu rangendo, revelando uma escada escura que descia.
“Uau.” Rachel parecia calma, mas eu não consegui dizer se ela estava fingindo ou não.
Ela tinha trocado para uma camiseta rota do Museu de Arte Moderna e seu usual jeans
colorido com canetinha, sua escova de cabelo de plástico azul saindo do seu bolso. Seu
cabelo vermelho estava preso pra trás, mas ainda tinha manchas de ouro nele, e traços
de purpurina dourada no rosto. “Então... depois de você?”
“Você é a guia,” Annabeth disse com uma educação fingida. “Guie.”
A escada levava a um largo túnel de tijolos. Estava tão escuro que eu não conseguia ver
dois passos à frente, mas Annabeth e eu tínhamos pegado lanternas. Logo que as
ligamos, Rachel gritou.
Um esqueleto sorria pra nós. Não era humano. Para começar, era enorme — no mínimo
três metros de altura. Ele tinha sido esticado, acorrentado pelos pulsos e tornozelos
formando um tipo de X gigante no meio do túnel. Mas o que realmente me deu arrepios
foi a grande órbita vazia no centro de seu crânio.
“Um ciclope,” disse Annabeth. “É muito velho. Não é... ninguém que a gente conheça.”
Não era Tyson, foi o que ela quis dizer. Mas isso não fez com que eu me sentisse muito
melhor. Ainda sentia como se ele tivesse sido colocado aqui como um aviso. O que quer
que pudesse matar um ciclope adulto, eu não queria conhecer.
Rachel engoliu em seco. “Você tem um amigo que é um ciclope?”
“Tyson,” eu disse. “Meu meio irmão.”
“Seu meio irmão.”
“Esperamos encontrá-lo aqui,” eu disse. “E Grover. Ele é um sátiro.”
“Ah.” Sua voz era baixa. “Então é melhor continuarmos andando.”
Ela passou por baixo do braço esquerdo do esqueleto, e continuou caminhando.
Annabeth e eu trocamos olhares. Ela deu de ombro. Seguimos Rachel para o labirinto.
Depois de quinze metros chegamos num cruzamento. À frente o túnel de tijolo
continuava. À direita, as paredes eram feitas de placas de mármore antigo. À esquerda,
o túnel estava sujo e havia raízes de árvores.
Apontei para esquerda. “Esse meio que parece com o túnel que Grover e Tyson
pegaram.”
Annabeth franziu as sobrancelhas. “É, mas a arquitetura do que está à direita — estas
pedras gastas — é mais provável que leve a uma parte antiga do labirinto, na direção da
oficina de Dédalo.”
“Precisamos seguir reto,” disse Rachel.
Annabeth e eu olhamos pra ela.
“Essa é escolha menos provável,” disse Annabeth.
“Vocês não veem?” Rachel perguntou. “Olhem para o chão.”
Eu não vi nada além de tijolos bem desgastados e lama.
“Tem uma claridade lá,” insistiu Rachel. “Bem fraca. Mas adiante é o caminho certo.
Para a esquerda, mais à frente no túnel, as raízes daquela árvore se movem como
antenas. Não gosto disso. Para a direita, há uma armadilha a seis metros abaixo.
Buracos nas paredes, talvez para lanças. Não acho que deveríamos arriscar.”
Eu não vi nada do que ela estava descrevendo, mas assenti. “Ok, adiante.”
“Você acredita nela?” perguntou Annabeth.
“Sim,” eu disse. “Você não?”
Annabeth me olhou como se quisesse discutir, mas ela acenou para Rachel seguir em
frente. Juntos seguimos pelo corredor de tijolos. Ele girou e mudou, mas não havia mais
túneis laterais. Parecíamos estar descendo, aprofundando cada vez mais no subsolo.
“Sem armadilhas?” perguntei ansioso.
“Nenhuma.” Rachel franziu as sobrancelhas. “Deveria ser tão fácil assim?”
“Não sei,” eu disse. “Nunca foi antes.”
“Então, Rachel,” disse Annabeth, “de onde você é, exatamente?”
Soou como se ela perguntasse, De que planeta você é? Mas Rachel não pareceu
ofendida.
“Brooklin,” disse ela.
“Seus pais não vão ficar preocupados por você estar fora tão tarde?”
Rachel suspirou. “Não muito. Eu poderia ficar fora por uma semana, e eles nem
notariam.”
“Por que não?” Dessa vez Annabeth não pareceu sarcástica. Ter problemas com os pais
era algo que ela entendia.
Antes que Rachel pudesse responder, houve um barulho de algo rangendo a nossa
frente, como grandes portas se abrindo.
“O que foi isso?” Annabeth perguntou.
“Não sei,” respondeu Rachel. “Dobradiças de metal.”
“Ah, ajudou muito. Quero dizer, o que é isso?”
Então ouvi pesados passos fazendo o corredor tremer — vindo ao nosso encontro.
“Correr?” perguntei.
“Correr,” Rachel concordou.
Viramos e fugimos pelo caminho que viemos, mas não percorremos seis metros antes
de nos deparamos com velhas amigas. Duas dracaenae — mulheres cobras em
armaduras gregas — ergueram seus dardos na altura dos nossos peitos. Parada entre elas
estava Kelli, a empousa líder de torcida.
“Ora, ora,” disse Kelli.
Eu destampei Contracorrente, e Annabeth puxou sua faca; mas antes que minha espada
mudasse da forma de caneta, Kelli apontou para Rachel. Sua mão transformou-se numa
garra e virou Rachel, segurando-a firme com suas garras em seu pescoço.
“Levando sua mortalzinha de estimação para uma caminhada?” Kelli me perguntou.
“São coisinhas tão frágeis. Tão fáceis de quebrar!”
Atrás de nós, os passos ficavam mais próximos. Uma grande forma apareceu na luz —
um Lestrigão de dois metros e meio com olhos vermelhos e presas.
O gigante lambeu os beiços quando nos viu. “Posso comê-los?”
“Não,” Kelli disse. “Seu mestre vai querer estes. Eles providenciarão um grande duelo
para diversão.” Ela sorriu pra mim. “Agora marchando, meio-sangues. Ou todos
morrerão aqui, começando pela garota mortal.”
***
Estávamos marchando túnel abaixo, escoltados pelas dracaenae, com Kelli e o gigante
logo atrás, para o caso de tentarmos fugir por ali. Ninguém pareceu se preocupar com a
ideia de fugirmos pela frente. Aquela era a direção que eles queriam que nós fôssemos.
Um pouco à frente eu podia ver portas de bronze. Elas tinham uns três metros de altura,
atravessadas por um par de espadas cruzadas. Detrás delas, vinha um rugido abafado,
como o de uma multidão.
“Ah, ssssssim,” disse a mulher cobra à minha esquerda. “Com o nosssso anfitrião,
vocêsss sssserão muito popularesssssss.”
Eu nunca tive a chance de olhar uma dracaenae muito de perto antes, e não estava
muito animado por ter a oportunidade. Ela teria um rosto bonito, exceto pela língua
bifurcada e os olhos amarelos, com pupilas no formato de fendas negras. Ela vestia uma
armadura de bronze que terminava na cintura. Abaixo, onde suas pernas deveriam estar,
havia dois troncos maciços de cobra, listrados de verde e bronze. Ela se movia com uma
combinação de andar e rastejar, como se ela estivesse em esquis vivos.
“Quem é o seu anfitrião?” perguntei.
Ela sibilou, o que deve ter sido uma risada. “Ah. Você vai desssscobrir. Você ficará
furiossssssssso. Ele é sssssseu irmão, afinal.”
“Meu o quê?” Imediatamente pensei em Tyson, mas isso era impossível. Do que ela
estava falando?
O gigante nos empurrou passando por nós e abriu a porta. Ele pegou Annabeth pela
blusa e disse, “Você fica aqui.”
“Ei!” ela protestou, mas o cara era duas vezes maior do que ela e já tinha confiscado sua
faca e minha espada.
Kelli riu. Ela ainda estava com as garras no pescoço de Rachel. “Vá, Percy. Divirta-nos.
Ficaremos aqui com seus amigos para garantir que você se comporte.”
Olhei para Rachel. “Sinto muito. Eu vou tirar você dessa.”
Ela assentiu o máximo que pôde com um demônio na sua garganta. “Isso seria bom.”
A dracaenae me empurrou porta à dentro com a ponta do dardo, e eu pisei no chão de
uma arena.
***
considerando que o lugar todo era no subterrâneo. O chão sujo era circular, grande o
suficiente para você dirigir um carro pela beira, se o mantivesse bem rente. No centro da
arena, uma luta estava acontecendo entre um gigante e um centauro. O centauro parecia
estar em pânico. Ele galopava ao redor de seu inimigo, usando espada e escudo,
enquanto o gigante segurava um dardo do tamanho de um poste de telefone e a multidão
aplaudia.
A primeira fileira de cadeiras ficava a três metros e meio acima do chão. Bancos de
rochas planas envolviam todo o lugar, e todos os assentos estavam ocupados. Tinha
gigantes, dracaenae, semideuses, telequines, e coisas mais esquisitas: demônios com
asas de morcego e criaturas que pareciam metade humana e a outra metade você
nomeava — pássaro, réptil, inseto, mamífero.
Mas as coisas mais arrepiantes eram as caveiras. A arena estava cheia delas. Elas
rodeavam a borda da grade. Pilhas de um metro delas decoravam os espaços entre os
bancos. Elas sorriam dos picos atrás da arquibancada e estavam penduradas em
correntes do teto, como candelabros horríveis. Algumas delas pareciam muito velhas —
nada além de ossos velhos esbranquiçados. Outras pareciam mais novas. Eu não vou
descrevê-las. Acredite em mim, você não ia querer que eu fizesse isso.
No meio de tudo isso, exposto orgulhosamente no lado da parede do espectador, havia
algo que não fez sentido pra mim — um estandarte verde com um tridente de Poseidon
no centro. O que aquilo estava fazendo num lugar horrível como esse?
Sobre o estandarte, sentado num lugar de honra, estava um velho inimigo.
“Luke,” eu disse.
Eu não tinha certeza se ele podia me escutar com todo o barulho da multidão, mas ele
sorriu friamente. Ele estava de calças camufladas, uma camiseta branca, com uma
couraça de bronze no peito, igual ao que eu vira no meu sonho. Mas ele ainda não
estava com sua espada, o que eu achei estranho. Ao seu lado estava o maior gigante que
eu já tinha visto, muito maior do que o que estava lutando na arena com o centauro. O
gigante perto de Luke devia ter uns quatro metros e meio de altura, facilmente, e era tão
grande que ocupava três lugares. Ele vestia só uma sunga de linho, como o traje de
sumô. Sua pele era vermelha escura e tatuada com desenhos de ondas azuis. Achei que
ele devia ser o novo guarda-costas de Luke ou algo assim.
Houve um grito no chão da arena, e eu pulei pra trás assim que o centauro caiu na terra
ao meu lado.
Ele encontrou meus olhos suplicando. “Ajuda!”
Eu procurei por minha espada, mas fora tomada de mim e não tinha reaparecido em meu
bolso ainda.
O centauro lutou para se levantar, enquanto o gigante se aproximava, seu dardo
preparado.
Uma grande garra agarrou meu ombro. “Ssse você valoriza asss vidasss de seusss
amigosss,” minha guarda dracaenae disse, “você não interferirá. Essssa não é a ssssua
luta. Essspere a ssssua vez.”
O centauro não conseguia levantar. Uma de suas pernas estava quebrada. O gigante
colocou seu pé enorme no peito do centauro e ergueu seu dardo. Ele olhava para Luke.
A platéia gritava, “MORTE! MORTE!”
Luke não fez nada, mas o cara tatuado do sumô sentado ao seu lado se levantou. Ele
sorria para o centauro que choramingava, “Por favor! Não!”
Então o cara do sumô fechou a mão, e fez o sinal polegar para baixo.
Fechei meus olhos enquanto o gigante gladiador estocava com o seu dardo. Quando
olhei de novo, o centauro se fora, desintegrado em cinzas. Tudo o que sobrou foi um
único casco, que o gigante pegou como um troféu e mostrou à platéia. Ela rugia
aprovando.
Um portão abriu no lado oposto do estádio, por onde o gigante saiu marchando em
triunfo.
Na arquibancada, o cara do sumô ergueu as mãos por silêncio.
“Boa diversão,” ele berrou. “Mas nada que eu já não tenha visto antes. O que mais você
tem, Luke, Filho de Hermes?”
Luke apertou a mandíbula. Eu podia apostar que ele não gostou de ser chamado de filho
de Hermes. Ele odiava seu pai. Mas ele se levantou calmamente. Seus olhos brilhavam.
Aliás, ele parecia estar de muito bom humor.
“Lorde Antaeus,” disse Luke, alto o suficiente para a multidão ouvir. “Você tem sido
um excelente anfitrião! Ficaremos felizes de entretê-lo, para agradecer o favor de poder
passar pelo seu território.”
“Um favor que eu ainda não concedi,” Antaeus grunhiu. “Eu quero diversão!”
Luke fez uma reverência. “Acredito que tenho algo mais interessante do que centauros
para lutar em sua arena agora. Tenho um irmão seu.” Ele apontou para mim. “Percy
Jackson, filho de Poseidon.”
A platéia começou a me vaiar e a jogar pedras em mim, a maioria eu consegui desviar,
mas uma me acertou na bochecha e fez um grande corte.
Os olhos de Antaeus brilharam. “Um filho de Poseidon? Então ele deve lutar bem! Ou
morrer bem!”
“Se a morte dele lhe agradar,” disse Luke, “você deixará nossos exércitos cruzarem seu
território?”
“Talvez!” disse Antaeus.
Luke não pareceu satisfeito com o “talvez”. Ele me fitou, como se estivesse me
avisando que era bom eu morrer de forma espetacular, ou eu teria sérios problemas.
“Luke!” gritou Annabeth. “Pare com isso. Deixe-nos ir!”
Ele pareceu notá-la pela primeira vez. Pareceu ficar atortoado por um momento.
“Annabeth?”
“Tem tempo suficiente para as lutas femininas depois,” interrompeu Antaeus.
“Primeiro, Percy Jackson, que armas você irá escolher?”
A dracaenae me empurrou para o meio da arena.
Eu encarei Antaeus. “Como você pode ser filho de Poseidon?”
“Eu sou seu filho favorito!” Antaeus estrondou. “Contemple, meu templo para o Treme
Terra, foi construído com os esqueletos de todos aqueles que eu matei em seu nome!
Em breve você se juntará a eles!”
Eu olhei horrorizado para todas as caveiras — centenas delas — e o estandarte de
Poseidon. Como esse podia ser um templo para o meu pai? Meu pai era um cara legal.
Ele nunca me pediu um cartão de Dia dos Pais, muito menos a caveira de alguém.
“Percy!” gritou Annabeth. “A mãe dele é Gaea! Gae —”
Seu guarda Lestrigão colocou a mão sobre a boca dela. Sua mãe é Gaea. A deusa da
terra. Annabeth estava tentando me dizer que aquilo era importante, mas eu não sabia o
porquê. Talvez seja só porque o cara tinha dois deuses como pais. Isso devia torná-lo
mais difícil de matar.
“Você é louco, Antaeus,” disse. “Se você acha que isso é um bom tributo, você não sabe
nada sobre Poseidon.”
A multidão gritava insultando-me, mas Antaeus ergueu a mão por silêncio.
“Armas,” ele insistiu. “E então veremos como você morre. Você tem machados?
Escudos? Redes? Lançadores de Chamas?”
“Apenas minha espada,” eu disse.
Risadas surgiram dos monstros, mas imediatamente Contracorrente apareceu em minhas
mãos, e algumas das vozes na multidão ficaram nervosas. A lâmina de bronze brilhava
com uma luz fraca.
“Primeiro Round!” Antaeus anunciou. Os portões se abriram, e uma dracaenae rastejou
para fora. Ela tinha um tridente em uma das mãos e uma rede pesada na outra — tipo
clássico de gladiador. Treinei contra essas armas no acampamento por anos.
Ela experimentou me golpear. Desviei para o lado. Ela jogou sua rede, esperando
prender a mão que eu segurava a espada, mas eu saí de lado facilmente, cortei seu
tridente ao meio, e deferi um golpe com Contracorrente numa fenda em sua armadura.
Com um gemido doloroso, ela vaporizou, e os gritos da multidão cessaram.
“Não!” gritou Antaeus. “Muito rápido! Você deve esperar para matar. Só quando eu der
a ordem!”
Eu olhei para Annabeth e Rachel. Eu tinha que achar um jeito de libertá-las, talvez
distrair seus guardas.
“Bom trabalho, Percy.” Luke sorriu. “Você melhorou o uso da espada. Eu lhe concedo
essa.”
“Segundo Round!” rugiu Antaeus. “E mais devagar desta vez! Mais diversão! Espere
pela minha ordem para poder matar alguém. OU ENTÃO!”
Os portões abriram novamente, e desta vez um jovem guerreiro saiu. Ele era um pouco
mais velho do que eu, por volta dos dezesseis. Ele tinha um cabelo preto brilhante, e seu
olho esquerdo era coberto por um tapa-olho. Ele era magro e rijo de forma que sua
armadura grega pendia solta. Ele apoiou sua espada no chão, ajustou seu escudo, e pôs
seu capacete de crina de cavalo.
“Quem é você?” perguntei.
“Ethan Nakamura,” ele respondeu. “Eu tenho que matar você.”
“Por que você está fazendo isso?”
“Ei!” um monstro gritou das arquibancadas. “Parem de falar e lutem!”
Os outros concordaram.
“Eu tenho que me colocar à prova,” Ethan me disse. “É o único jeito de ser aceito.”
E com isso ele atacou. Nossas espadas se encontraram no ar e a platéia gritou. Aquilo
não parecia certo. Eu não queria lutar para divertir um monte de monstros, mas Ethan
Nakamura não estava me dando muita escolha.
Ele pressionou avançando. Ele era bom. Ele nunca esteve no Acampamento Meio-
Sangue, que eu saiba, mas ele fora treinado. Ele desviou meu golpe e quase me
derrubou com seu escudo, mas eu pulei pra trás. Ele atacou, eu rolei para um lado. Nós
trocamos estocadas e desvios, um experimentando o estilo de luta do outro. Tentei me
manter no lado cego de Ethan, mas não ajudou muito. Ele parecia estar lutando com um
olho só há bastante tempo, porque ele era excelente guardando seu lado esquerdo.
“Sangue!” gritavam os monstros.
Meu oponente olhou para a platéia. Essa era sua fraqueza, percebi. Ele precisava
impressionar a platéia, eu não.
Ele soltou um grito raivoso de batalha e me atacou, mas eu desviei sua lâmina e me
afastei, deixando-o vir atrás de mim.
“Buu!” vaiou Antaeus. “Fique e lute.”
Ethan me pressionou, mas eu não tinha problema em me defender, mesmo sem um
escudo. Ele estava vestido para se defender — armadura pesada e escudo — o que
tornava cansativo atacar. Eu era um alvo mais fácil, mas também era mais leve e mais
rápido. A multidão foi a loucura, gritando reclamações e tacando pedras. Estávamos
lutando há quase cinco minutos e não havia nenhuma gota de sangue.
Finalmente Ethan cometeu seu erro. Ele tentou me acertar na barriga, e eu prendi o
punho de sua espada com o meu e torci. Sua espada caiu no chão. Antes que ele pudesse
se recuperar, eu bati com a base da minha espada em seu capacete e o derrubei. Sua
armadura pesada me ajudou mais que ele. Ele caiu de costas, atordoado e cansado.
Coloquei a ponta da minha espada em seu peito.
“Termine com isso,” Ethan grunhiu.
Eu olhei para Antaeus. Seu rosto vermelho estava rígido de desgosto, mas ele ergueu
sua mão e fez o polegar para baixo.
“Esquece.” Eu abaixei minha espada.
“Não seja idiota,” grunhiu Ethan. “Eles vão matar nós dois.”
Eu estendi minha mão. Relutantemente, ele a segurou. Eu o ajudei a levantar.
“Ninguém desonra os jogos!” rugiu Antaeus. “Suas cabeças servirão como tributo a
Poseidon!”
Olhei para Ethan. “Quando você tiver chance, corra.” Depois me virei para Antaeus.
“Por que você mesmo não luta comigo? Se você tem a proteção do Pai, venha aqui
embaixo e prove!”
Os monstros murmuraram nas arquibancadas. Antaeus deu uma olhada em volta, e
aparentemente viu que não tinha escolha. Ele não podia dizer não sem parecer um
covarde.
“Eu sou o melhor lutador do mundo, rapaz,” ele avisou. “Venho lutando desde o
primeiro Pancrácio!”
“Pancrácio?” perguntei.
“Ele quer dizer as lutas até a morte,” disse Ethan. “Sem regras. Sem barreiras.
Costumava ser um esporte Olímpico.”
“Valeu pela cola,” eu disse.
“De nada.”
Rachel me olhava com olhos bem abertos. Annabeth mexia sua cabeça loucamente, a
mão do Lestrigão continuava tapando sua boca.
Apontei minha espada para Antaeus. “O vencedor leva tudo! Se eu vencer, somos todos
libertados. Se você ganhar, morremos. Jure pelo Rio Styx!
Antaeus gargalhou. “Isso não vai demorar muito. Eu juro de acordo com as suas
condições!”
Ele saltou por sobre a grade para dentro da arena.
“Boa sorte,” Ethan me disse. “Você vai precisar.” Depois ele se afastou rapidamente.
Antaeus estalou seus dedos. Ele sorriu ironicamente, e eu vi que até mesmo seus dentes
tinham tatuagens de ondas, o que devia tornar a escovação após as refeições bem
dolorosa.
“Armas?” ele perguntou.
“Ficarei com minha espada. Você?”
Ele mostrou suas mãos enormes e mexeu os dedos. “Eu não preciso de mais nada!
Mestre Luke, você será o juiz desta vez.”
Luke sorriu para mim. “Com prazer.”
Antaeus atacou. Eu rolei por debaixo de suas pernas e apunhalei sua coxa por trás.
“Arghhhhhh!” ele gritou. Mas onde deveria estar sangrando, havia um jorro de areia,
como se eu tivesse quebrado o lado de uma ampulheta. Ela caiu no chão de terra, e a
terra começou a rodear suas pernas, quase como um molde. Quando a terra caiu, a ferida
havia desaparecido.
Ele atacou de novo. Por sorte eu tinha alguma experiência em lutar com gigantes.
Desviei para o lado desta vez e golpeei embaixo de seu braço. A lâmina de
Contracorrente estava enterrada até o punho em suas costelas. Essa era a boa notícia. A
má notícia foi que Contracorrente foi puxada de minha mão quando o gigante se virou, e
eu fui jogado através da arena, desarmado.
Antaeus gritou de dor. Esperei que ele se desintegrasse. Nenhum monstro jamais
sobreviveu a um ataque direto da minha espada assim. A lâmina de bronze celestial
tinha que ter destruído sua essência. Mas Antaeus apalpou suas costelas, puxou a espada
e jogou-a para trás. Mais areia jorrou da ferida, mas de novo a terra veio e a cobriu.
Areia envolvia seu corpo todo até os ombros. Assim que a terra caiu, Antaeus estava
bem.
“Agora você vê porque eu nunca perco, semideus!” grunhiu Antaeus. “Venha cá e me
deixe esmagá-lo. Prometo que será rápido!”
Antaeus estava entre mim e minha espada. Desesperado, olhei para ambos os lados, e
notei os olhos de Annabeth.
A terra, pensei. O que Annabeth tinha tentado me dizer? A mãe de Antaeus era Gaea, a
mãe terra, a deusa mais antiga de todas. O pai de Antaeus podia ser Poseidon, mas Gaea
o mantinha vivo. Eu não poderia feri-lo enquanto ele estivesse tocando a terra.
Eu tentei rodeá-lo, mas Antaeus antecipou meus movimentos. Ele bloqueou meu
caminho, rindo. Ele estava só brincando comigo agora. Ele tinha me encurralado.
Eu olhei para as correntes que pendiam do teto, suspendendo as caveiras de seus
oponentes. De repente tive uma ideia.
Eu fintei para o outro lado. Antaeus me bloqueou. A multidão zombou e gritou para
Antaeus acabar comigo, mas ele estava se divertindo muito.
“Garoto insignificante,” ele disse. “Não é digno de ser filho do deus do mar!”
Senti minha caneta retornar ao meu bolso, mas Antaeus não sabia disso. Ele ainda
achava que Contracorrente estava na terra atrás dele. Ele acharia que minha intenção era
conseguir a espada. Não era muita vantagem, mas era tudo o que eu tinha.
Eu investi para frente, abaixando-me para que ele pensasse que eu ia rolar por debaixo
de suas pernas de novo. Enquanto ele estava parado, preparado para me pegar como
uma bola, eu pulei o máximo que podia — chutando seu antebraço, subindo por seu
ombro como se fosse uma rampa, pisando em sua cabeça. Ele fez o que se esperava. Ele
se endireitou indignado e gritou “Ei!” Eu pulei, usando a sua força para me catapultar na
direção do teto. Eu segurei o topo de uma corrente, e os crânios e os ganchos soavam
estridentes abaixo de mim. Enrosquei minhas pernas nas correntes, do jeito como
costumava fazer com as cordas na aula de Educação Física. Puxei Contracorrente e
arrebentei a corrente ao lado.
“Desça aqui, covarde!” praguejou Antaeus. Ele tentou me agarrar, mas eu já estava fora
de alcance. Segurando pela minha linda vida, eu gritei, “Venha aqui me pegar! Ou você
é muito gordo e lento?”
Ele pegou impulso e tentou me pegar de novo. Ele segurou uma corrente e tentou subir.
Enquanto ele se esforçava, eu desci minha corrente cortada, o gancho primeiro. Precisei
de duas tentativas, mas finalmente eu o prendi na tanga de Antaeus.
“WAAA!” ele gritou. Rapidamente eu escorreguei a corrente livre pela argola da minha
própria corrente, puxei, e firmei o máximo que podia. Antaeus tentou voltar ao chão,
mas seu corpo estava suspenso pela sua tanga. Ele teve que se segurar em outras
correntes com ambas as mãos para evitar ficar de cabeça pra baixo. Rezei para que as
correntes e a tanga aguentassem por mais alguns segundos. Enquanto Antaeus
praguejava e se segurava, eu me mexi pelas correntes, balançando como se fosse algum
tipo de macaco maluco. Eu dava giros com os ganchos das correntes. Eu não sei como
eu fiz aquilo. Minha mãe sempre disse que eu tenho um dom para emaranhar as coisas.
Além disso, eu estava desesperado para salvar meus amigos. De qualquer forma, em
poucos minutos o gigante estava suspenso sobre o chão, grunhindo entre correntes e
ganchos, indefeso. Eu pulei no chão, ofegante e suado. Minhas mãos estavam
machucadas pela escalada.
“Desça-me daqui!” Antaeus exigiu.
“Solte-o!” Luke ordenou. “Ele é o nosso anfitrião!”
Eu destampei Contracorrente. “Eu vou soltá-lo.”
Eu acertei o gigante no estômago. Ele rugiu, e areia derramou, mas ele estava muito
longe para tocar o chão, e a terra não se ergueu para ajudá-lo. Antaeus simplesmente se
dissolveu, esvaindo-se pouco a pouco, até não sobrar mais nada além de correntes
vazias, uma grande tanga de linho em um gancho, e um monte de caveiras sorridentes
dançando sobre mim como se elas finalmente tivessem um motivo pra sorrir.
“Jackson!” Luke gritou. “Eu já devia ter te matado há muito tempo!”
“Você cansa,” lembrei a ele. “Agora nos deixe ir, Luke. Tivemos um acordo
juramentado com Antaeus. Eu sou o vencedor.”
Ele fez o que eu esperava. Ele disse, “Antaeus está morto. Seu juramento morre com
ele. Mas como eu estou me sentindo piedoso hoje, eu o matarei bem rápido.”
Ele apontou para Annabeth. “Poupe a garota.” Sua voz falhou um pouco. “Eu quero
falar com ela antes — antes de nossa grande vitória.”
Cada monstro na multidão puxou sua arma ou mostrou suas garras. Nós estávamos
encurralados. Desesperadamente em desvantagem.
Foi quando senti uma coisa em meu bolso — uma sensação gelada, um frio crescendo
mais e mais. O apito canino. Meus dedos se fecharam em volta dele. Por dias eu evitei
usar o presente de Quintus. Tinha que ser uma armadilha. Mas agora... Eu não tinha
escolha. Eu o tirei de meu bolso e soprei. Não fez nenhum som enquanto estilhaçava-se
em pedaços de gelo, derretendo na minha mão.
Luke riu. “O que isso deveria fazer?”
Atrás de mim surgiu um grito de surpresa. O gigante Lestrigão que guardava Annabeth
voou por mim e chocou-se contra parede.
“AROOOOF.”
Kelli, a empousa, gritou quando um mastim negro de mais de duzentos quilos a pegou
como um brinquedo para mastigar e a lançou pelo ar, direto no colo de Luke. A Sra
O’Leary rosnou, e as duas guardas dracaenae se afastaram. Por um momento os
monstros na plateia foram pegos de surpresa.
“Vamos lá!” Eu gritei para meus amigos. “Aqui, Senhora O’Leary!”
“A saída mais longe!” gritou Rachel. “Aquele é o caminho certo!”
Ethan Nakamura pegou sua deixa. Juntos corremos pela arena e pela saída mais
distante, a Sra O´Leary logo atrás de nós. Enquanto corríamos, eu podia ouvir os sons
desorganizados de um exército inteiro tentando pular das arquibancadas e nos seguir.
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