10. Outubro: Encontro com Darcy

DOMING0, 1º DE OUTUBRO

55,8kg, 17 cigarros, 0 unidade alcoólica (m.b, principalmente porque estive numa festa).

4h. Incrível. Esta foi uma das noites mais incríveis da minha vida.
Na sexta-feira, Jude veio me visitar porque eu estava deprimida. Disse para eu ser mais
positiva com as coisas e trouxe um maravilhoso vestido preto para eu usar na festa. Fiquei
preocupada porque podia pingar ou deixar cair alguma coisa nele, mas Jude disse que tinha
muito dinheiro e muitas roupas, graças ao seu bom emprego, e não se importava com o que
pudesse acontecer com o vestido - portanto, eu podia ficar tranqüila. Adoro Jude. As garotas
são muito mais legais que os homens (com exceção de Tom, mas ele não vale, é gay). Resolvi
comprar um acessório para o maravilhoso vestido, uma meia-calça de lycra que custou 6,95
libras e usar o sapato de camurça da loja Pé no chão (tirei o purê de batata que estava grudado
nele).
Levei um susto quando cheguei na casa de Mark Darcy para a festa: não era uma simples
casa branca com terraço na rua Portland ou similar, como eu imaginava, mas uma enorme
casa estilo bolo de noiva, do outro lado da avenida Holland Park (onde dizem que mora o
teatrólogo Harold Pinter), no meio de jardins.
Sem dúvida, ele caprichou na festa para os pais. Todas as árvores estavam iluminadas com
lâmpadas vermelhas e guirlandas de corações vermelhos, lindo, e havia um caminho coberto
com toldo vermelho e branco até a entrada da casa.
Quando chegamos na porta, as coisas ficaram ainda mais requintadas: uma equipe de
recepção nos serviu champanhe e recebeu os presentes (comprei um CD com as músicas
românticas de Perry Como do ano que Malcolm e Elaine se casaram, mais um queimador de
óleo aromático da loja Body Shop para ela, que durante o bufê do peru ao curry perguntou
onde comprei o meu). Depois os convidados eram conduzidos até uma escadaria de madeira
que formava uma curva e tinha os degraus iluminados por velas em forma de coração. No
andar de baixo havia um amplo salão de tacos de madeira escura e uma estufa que abria para
o jardim. O salão inteiro era iluminado por velas. Papai e eu ficamos parados olhando, sem
conseguir falar.
Em vez dos aperitivos que eram de se esperar num coquetel da geração de meus pais - com
pratos de vidro oferecendo diversos tipos de pepino em conserva, ou palitinhos de queijo e
abacaxi espetados em grapefruits -, havia enormes bandejas de prata com camarões gigantes,
minitortas de tomate, mozarela e frango. Os convidados pareciam não acreditar que estavam
ali, felicíssimos. Mas Una Alconbury estava com cara de quem acabou de chupar um limão.
Quando papai a viu, concluiu:
— Ah, querida, não tenho certeza se mamãe e Una vão gostar desta festa.
— Um pouco exagerado, não? - perguntou Una, ajeitando a estola nos ombros, meio malhumorada.
— Se você exagera, as coisas acabam ficando vulgares.
— Ah, isso não é verdade, Una. A festa está maravilhosa - aparteou meu pai, servindo-se
do décimo nono canapé.
— Humm, concordo - falei, com a boca cheia de minitorta e com minha taça de
champanhe sendo completada pelo garçom sem eu nem perceber. — Está superótimo.
Depois de passar horas preocupada por causa do duas-peças da Jaeger, fiquei eufórica.
Ninguém nem perguntou por que eu ainda não tinha casado.
— Arf - gemeu Una.
Mamãe estava prestando atenção em nós.
— Bridget, já falou com Mark? - perguntou, bem alto.
De repente lembrei que Una e mamãe deviam estar perto de fazer bodas de rubi. Conheço
mamãe, por isso é pouco provável que um pequeno detalhe como largar o marido para ficar
com um guia turístico vá atrapalhar as comemorações. Ela também não vai deixar que Elaine
Darcy faça uma festa melhor - mesmo que o custo seja um casamento de conveniência de uma
filha indefesa.
— Agüenta firme, meu bem - disse papai, apertando meu braço.
— Que casa linda. Você não tem uma estola bonita para colocar nos ombros, Bridget? O
quê, seu pai está com caspa? - constatou mamãe, batendo nas costas dele. — Escute, querida
por que você ainda não falou com Mark?
— Bom, eu... - resmunguei.
— O que você acha da decoração, Pam? - sussurrou Una.
— Exagerada - respondeu mamãe, baixinho, fazendo um movimento com os lábios que
mostrava certo desprezo.
— Exatamente o que eu achei - concordou Una, feliz.
— Não foi, Colin? Exagerada.
Dei uma olhada em volta e quase morri de susto. Mark Darcy estava a dez passos, olhando
para nós. Devia ter ouvido tudo. Abri a boca para dizer alguma coisa – não sei bem o quê - e
melhorar a situação, mas ele se afastou.
O jantar foi servido na "Sala de estar" do térreo e na fila das escadas, fiquei exatamente
atrás de Mark Darcy.
— Olá - cumprimentei, tentando amenizar a grosseria de mamãe. Ele deu uma olhada em
volta, sem tomar conhecimento de mim, e olhou de novo para trás. — Olá - repeti, dando uma
leve cutucada nele.
— Ah, olá. Desculpe, não tinha visto você - explicou.
— Que festa ótima. Obrigada por me convidar - falei.
Ele ficou me olhando.
— Ah, não fui eu, foi minha mãe que convidou - disse.
— Agora tenho de, bem, cuidar de colocar as pessoas nas mesas. Gostei muito da sua
reportagem sobre o Corpo de Bombeiros de Lewisham - completou ele, subindo as escadas,
passando entre os convidados e se desculpando enquanto eu ficava ali, sem saber o que fazer.
Argh.
Quando ele chegou no alto da escada, Natasha surgiu num incrível vestido de cetim
dourado, dependurou-se no braço dele e, sem querer, bateu numa das velas, que espirrou cera
vermelha na barra de sua roupa.
— Merda - reclamou. — Merda.
Os dois sumiram, mas dava para ouvir a voz dela reclamando.
— Eu disse, foi ridículo passar a tarde inteira colocando velas em lugares onde as pessoas
podiam tropeçar. Teria sido melhor você usar seu tempo verificando o lugar dos convidados
nas mesas.
Por incrível que pareça, as pessoas estavam muito bem colocadas. O lugar de mamãe não
era perto de papai nem de Julio, mas de Brian Enderby, com quem ela sempre gostou de fazer
charme. Julio estava ao lado da elegante tia cinqüentona de Mark, que exultou de felicidade.
Papai ficou azul de alegria por ter sido colocado ao lado de uma linda oriental. Eu estava toda
animada. Quem sabe ficava sentada entre dois belos amigos de Mark Darcy, grandes
advogados, ou mesmo americanos nascidos na tradicional Boston. Mas, quando fui procurar
meu nome no mapinha das mesas, ouvi uma voz conhecida falando à minha direita.
— Então, como vai minha Bridgezinha? Sou um homem de sorte: me colocaram ao seu
lado na mesa. Una me contou que você terminou o namoro. Arre! Quando é que vamos
conseguir casar você?
— Espero que, quando conseguirem, eu celebre a cerimônia religiosa - disse uma voz à
minha esquerda. — Eu poderia usar um novo paramento. Hum, de seda creme. Ou talvez uma
linda batina fechada com 39 botõezinhos da etiqueta Gamirellis.
Mark tinha tido o cuidado de me colocar entre Geoffrey Alconbury e o padre gay.
Mas, depois de bebermos um pouco, a conversa ficou bem animada. Perguntei ao padre o
que ele achava do milagre das imagens indianas de Ganesh, o deus-elefante, que bebiam leite.
Ele respondeu que as autoridades eclesiásticas achavam que o milagre na imagem de barro era
causado pelo calor de um verão muito quente alternado com dias frios.
Quando o jantar terminou e as pessoas começaram a descer para dançar no andar de baixo,
fiquei pensando no que o padre disse. Curiosa, e temendo ser obrigada a dançar twist com
Geoffrey Alconbury, pedi licença e discretamente peguei uma colher de chá e um potezinho
de leite da mesa e entrei no quarto onde os presentes estavam expostos, comprovando o que
Una tinha dito sobre tudo ser muito exagerado.
Levei algum tempo para conseguir achar meu queimador de óleo aromático, que tinha sido
colocado num canto e, quando o vi, derramei um pouco de leite na colher e pus no lugar onde
fica a vela. Incrível. O queimador estava bebendo o leite. Dava para ver o leite sumindo.
— Meu Deus, é um milagre! - gritei, sem imaginar que, exatamente nessa hora, Mark
Darcy estava passando.
— O que está fazendo? - perguntou ele, da porta.
Eu não sabia o que dizer. Claro que ele deve ter achado que eu estava querendo roubar
algum presente.
— Hein? - insistiu.
— O queimador de óleo que dei para sua mãe está bebendo o leite - murmurei, incrédula.
— Ah, não seja boba - disse ele, rindo.
— Está - falei, indignada. — Olhe.
Coloquei mais um pouco de leite na colher, derramei no queimador e ele foi sumindo.
— Está vendo? É um milagre - constatei, orgulhosa.
Ele ficou muito intrigado, tenho certeza.
— Você tem razão, é um milagre - disse, devagar.
Nesse instante, Natasha apareceu na porta e, ao me ver, cumprimentou:
— Olá. Hoje não está de coelhinha, não? - e deu uma risadinha para fazer de conta que seu
comentário venenoso era uma piada divertida.
— É que nós, coelhinhas, usamos isso no inverno para nos aquecer - expliquei.
— Um vestido de John Rocha? - perguntou, olhando para o vestido de Jude que eu estava
usando. — Da coleção do outono passado, não? Reconheci a bainha.
Fiquei pensando em alguma coisa bem arguta e cortante para dizer mas, infelizmente, não
consegui achar nada. Depois de uma pequena pausa, falei:
— Bom, acho que você está louca para circular pela festa. Gostei de te ver outra vez.
Tchau!
Eu precisava ir para o jardim tomar um pouco de ar fresco e fumar um cigarro. Estava uma
noite linda, quente e estrelada, com a lua iluminando todos os canteiros de rododendros. Na
verdade, não gosto muito dessa flor, ela me lembra as casas de campo vitorianas do norte da
Inglaterra como as descritas nos livros de D. H. Lawrence, onde as pessoas se afogam em
lagos. Desci a escada para a parte inferior do jardim. Dentro da casa, tocavam valsas
vienenses com tanto entusiasmo que parecia que o mundo ia acabar. De repente ouvi um
barulho perto e vi a silhueta de um corpo nas janelas envidraçadas. Era um rapaz jovem e
atraente do tipo que freqüenta colégio público.
— Oi - disse o jovem. Acendeu um cigarro, meio desajeitado, e desceu a escada até onde
eu estava. — Você não gostaria de dançar? Ah, desculpe, não me apresentei - disse,
estendendo a mão como se estivéssemos no primeiro dia de aula da Universidade de Eton e
ele fosse o ex-reitor que tinha esquecido as boas maneiras. — Meu nome é Simon Dalrymple.
— Bridget Jones - falei, estendendo a mão e me sentindo um membro do Ministério da
Guerra.
— Oi. Legal te conhecer. Então, vamos dançar? - disse ele, parecendo o rapaz de colégio
público outra vez.
— Bom, não sei - falei, querendo escapar e dando sem querer uma risada que parecia de
uma prostituta de cais.
— Estou falando em dançar aqui mesmo. Só um pouqumho.
Fiquei sem saber. Estava achando a idéia agradável, para dizer a verdade. Acontecer uma
coisa dessas, depois de fazer um milagre para Mark Darcy - aquilo estava começando a me
subir à cabeça.
— Por favor - insistiu Simon. — Nunca dancei com uma mulher mais velha. Ah, desculpe,
não quis ... - continuou, ao ver minha cara. — Quero dizer com alguém que já saiu do colégio
- completou, olhando para minha mão com olhos apaixonados. — Você se incomoda? Eu
ficaria muito, muito grato.
Claro que Simon Dalrymple sabia dança de salão desde que nasceu, por isso me guiava
com perfeição. O problema era que ele parecia estar, bem, para ir direto ao assunto, com a
maior ereção que já tive a sorte de ver na vida e dançávamos tão juntos que não dava para
confundir aquilo com um estojo de lápis.
— Agora é minha vez, Simon - disse uma voz.
Era Mark Darcy.
— Ande, volte para dentro. A essa hora você devia estar na cama.
Simon ficou completamente arrasado. Enrubesceu e foi embora, correndo.
— Dançamos? - perguntou Mark, estendendo a mão.
— Não - falei, furiosa.
— O que houve?
— Humm - disse, tentando achar uma desculpa para estar tão irritada. — Foi horrível você
fazer isso com um jovem, impondo-se e humilhando-o numa idade em que os meninos são tão
vulneráveis - quando percebi a cara surpresa dele, recuei. — Mas gostei que me convidasse
para a festa. Obrigada, está maravilhosa.
— É, acho que você já disse isso - falou Mark, piscando muito. Ele parecia muito agitado e
magoado. — Eu ... ele parou e começou a andar pelo pátio, suspirando e passando a mão pela
cabeça. — Você... tem lido algum livro bom?
Inacreditável.
— Mark, se você me fizer essa pergunta mais uma vez, corto minha cabeça. Por que não
pergunta outra coisa? Mude um pouco de assunto. Pergunte se eu tenho algum hobby, o que
acho da moeda única européia, ou se tive alguma experiência estranha com camisinhas.
— Eu ... - começou ele outra vez.
— Ou pergunte com qual desses eu preferia transar: Douglas Hurd, Michael Howard ou
Jim Davidson. Na verdade, não teria a menor dúvida: prefiro Douglas Hurd.
— Douglas Hurd? - repetiu Mark.
— Hum. Isso mesmo, faz um tipo bem certinho, mas é interessante.
— Ahn - disse Mark, como se estivesse refletindo sobre o que eu disse. — Mas ele tem
uma mulher muito atraente e inteligente. Ele deve ter algum charme oculto.
— Qual, por exemplo? - perguntei, ingênua, esperando que ele dissesse algo a respeito de
sexo.
— Bom ...
— Ele deve ser bom de cama - completei.
— Ou um ceramista muito talentoso.
— Ou um ótimo aromaterapeuta.
— Você aceita jantar comigo, Bridget? - perguntou ele de repente, bravo, como se fosse
me sentar numa mesa em algum lugar e me passar um sermão.
Parei e fiquei olhando para ele.
— Foi minha mãe quem sugeriu? - perguntei, desconfiada.
— Não, eu...
— Foi Una Alconbury?
— Não, não ...
De repente, entendi quem podia ser.
— Foi a sua mãe, não?
— Bom, minha mãe...
— Não quero ser convidada para jantar só porque sua mãe pediu. E sobre o que
conversaríamos? Você ia ficar me perguntando se eu tinha lido algum livro bom e eu teria de
dar alguma desculpa esfarrapada e...
Ele me olhou, sem graça.
— Mas Una Alconbury me disse que você era uma leitora voraz, que adora livros.
— Ah, foi? - perguntei, satisfeita. — O que mais ela disse?
— Bom, que você é uma feminista radical e tem uma vida muito interessante ...
— Aaah - concordei.
— ... sempre sai com milhares de homens.
— Hum.
— Soube do caso com Daniel. Sinto muito.
— Acho que você até tentou me prevenir. Mas o que você tinha contra ele?
— Ele dormiu com a minha mulher - disse ele. — Duas semanas depois que casamos.
Fiquei olhando para ele, completamente sem graça, até que uma voz lá em cima gritou:
— Markee!
Era Natasha, com o corpo contra a luz, debruçada na janela para ver o que estava
acontecendo.
— Markee! - gritou ela outra vez. — O que está fazendo aí?
— No Natal, cheguei a achar que, se minha mãe me falasse mais uma vez em Bridget
Jones - disse ele, apressado -, eu iria à redação do Sunday People acusá-la de ter me
molestado com uma bomba de bicicleta quando eu era criança. Mas depois que conheci você
... eu estava com aquele suéter de losangos ridículo que Una tinha me dado de presente de
Natal. Bridget, todas as outras garotas que conheço são tão superficiais. Não conheço
nenhuma que tenha coragem de usar um rabinho ou...
— Mark! - berrou Natasha, descendo a escada na nossa direção.
— Mas você tem namorada - falei, dizendo o óbvio.
— Para dizer a verdade, não tenho mais - contou ele. — Só jantar? Um dia desses?
— Tá - sussurrei. — Tá.
Depois achei que era melhor ir embora: e se Natasha ficasse me observando como uma
crocodila chocando seus ovos, dos quais eu estava me aproximando, dando meu endereço e
telefone para Mark Darcy e marcando encontro para a próxima terça-feira? Quando passei
pelo salão de festas vi mamãe, Una e Elaine Darcy numa animada conversa com Mark. Não
pude evitar imaginar a cara que elas fariam se soubessem o que tinha acabado de acontecer.
De repente imaginei como seria o próximo bufê do peru ao curry, com Brian Enderby
levantando o cós da calça e dizendo: "Arre, é ótimo ver que os jovens estão se divertindo,
não?" e Mark Darcy e eu sendo obrigados a fazer gracinhas como dar beijinhos ou fazer sexo
na frente deles, igual a um casal de focas amestradas.

TERÇA-FEIRA, 3 DE OUTUBRO

56,2 kg, 3 unidades alcoólicas (m.b.), 21 cigarros (ruim), número de vezes que pronunciei a
palavra “maldito” nas últimas 24 horas: 369 (aprox.).

19h30. Estou em pânico. Daqui a meia hora Mark Darcy passa para me pegar. Acabo de
chegar do trabalho, meu cabelo está horrível e infelizmente continua o mesmo caos com as
roupas para lavar. Socorro, ai, socorro. Estava pensando em usar meu jeans 501 branco, mas
lembrei que Mark deve ser do tipo que vai me levar num restaurante muito fino. Ai, Deus, não
tenho nada fino para vestir. Será que ele acha que eu vou aparecer de rabinho de coelha? Não
que eu esteja interessada nele nem nada.
19h50. Ai, Deus, ai, Deus. Ainda não lavei a cabeça. Vou tomar um banho rápido.
20h. Secando o cabelo. Espero que Mark Darcy se atrase porque não quero que me encontre
de roupão e cabelo molhado.
20h05. O cabelo já está mais ou menos seco. Agora só falta me maquiar, vestir e enfiar atrás
do sofá tudo o que está sobrando pela casa. Vou por etapas. Acho que o mais importante é a
maquiagem, depois arrumar a sala.
20h15. Ele ainda não chegou. M. b. Acho ótimo homem que se atrasa para um compromisso,
é melhor do que aqueles que chegam antes da hora e provocam pânico por causa de todas as
coisas que ainda estão esparramadas pela casa.
20h20. Bom, agora estou completamente pronta. Acho que vou mudar de roupa.
20h30. Estranho. Como é que ele pode estar atrasado mais de meia hora.
21h. Não dá para acreditar. Mark Darcy me deu um bolo. Maldito!

QUINTA-FEIRA, 5 DE OUTUBRO

56,7kg (ruim), 4 barras de chocolate (ruim), número de vezes que assisti ao vídeo: 17 (ruim).

11h. Estou no banheiro do trabalho. Ai, não, ai, não. Para completar a minha derrota, hoje fui
o centro das atenções na reunião da manhã.
— Certo, Bridget, vou dar mais uma oportunidade para você - disse Richard Finch. — O
julgamento da atriz Isabella Rossellini. A decisão do júri deve sair hoje e acho que ela vai ser
absolvida. Vá até o Tribunal. Não quero ver você na tela trepada em nenhum mastro ou poste.
Quero uma boa entrevista. Pergunte a ela se acha certo a gente sair matando todo mundo com
quem não estamos a fim de transar. Então, Bridget, o que está esperando? Pode ir.
Eu não tinha a menor ou a mais remota idéia do assunto sobre o qual ele estava falando.
— Você sabe do processo da Isabella Rossellini, não? Você às vezes lê jornal, não? -
perguntou Richard.
O problema nesse tipo de trabalho é que as pessoas ficam citando nomes e casos e você
tem apenas um segundo para resolver se deve ou não confessar que não sabe do que estão
falando e, se perde a oportunidade de dizer isso, vai passar a próxima meia hora tentando
descobrir uma pista, mas sempre mantendo uma expressão confiante, de quem sabe
exatamente o que aconteceu com Isabella Rossellini.
Daqui a cinco minutos tenho de encontrar uma assustadora equipe de filmagem no
Tribunal para cobrir o julgamento e mostrar tudo na tevê, sem ter a menor idéia do que se
trata.
11h05. Graças a Deus, Patchouli existe. Saí do banheiro e ela estava no corredor, tentando
conter os cachorros de Richard pela coleira.
— Está tudo bem? - disse ela — Você parece meio assustada.
— Não, não, estou ótima - garanti.
— É mesmo? - e ficou me olhando. — Escuta aqui, você percebeu que ele não estava
querendo dizer Isabella Rossellini, não? Ele quis dizer Elena Rossini.
Ah, graças a Deus e todos os anjos do céu. Elena Rossini é a babá acusada de matar o
patrão depois que ele a violentou várias vezes e prendeu-a em casa durante 18 meses. Peguei
dois jornais para ler os detalhes e corri para um táxi.
15h. Não posso acreditar no que aconteceu. Eu estava no Tribunal há horas, com a equipe e
um monte de repórteres, aguardando o final do julgamento. Aliás, foi divertido à beça.
Comecei até a achar graça do fato de ter levado um bolo do Sr. Calças Engomadas Mark
Darcy. De repente, percebi que meus cigarros tinham acabado. Cochichei para o câmera, que
era um amor, para saber se tinha problema eu ir rápido até uma tabacaria e ele disse que não,
porque quando os funcionários avisassem que o julgamento tinha terminado, iriam me
chamar.
Como os colegas ouviram que eu ia até a tabacaria, todos encomendaram cigarros e balas.
Levei um bom tempo para conseguir comprar tudo. Estava na tabacaria tentando separar os
trocos quando um grandalhão chegou apressado e pediu ao vendedor:
— Me dê uma caixa de balas Quality Street, por favor? - como se eu não estivesse na
frente. O pobre vendedor ficou me olhando sem saber o que fazer.
— Desculpe, mas o senhor sabe o significado da palavra fila? - perguntei numa voz bem
irritada, virando para o homem. Emiti um ruído estranho. Era Mark Darcy todo paramentado,
de toga. Ele ficou me olhando daquele seu jeito.
— Onde diabos você se meteu ontem à noite? - perguntei.
— Devolvo a pergunta - disse ele, ríspido.
Foi nesse instante que o meu câmera entrou na tabacaria.
— Bridget - gritou. — Perdemos a entrevista. Elena Rossini saiu e foi embora. Comprou as
balas?
Pasma, segurei na beira do balcão para não cair. .
— Perdemos a entrevista? - repeti, quando consegui recobrar o fôlego. — Perdemos? Ai,
Deus. Era minha última oportunidade depois do escape dos Bombeiros e eu fui comprar balas.
Vou ser demitida. Os outros repórteres fizeram a entrevista?
— Ela não deu nenhuma entrevista - avisou Mark Darcy.
— Não? Mas como você sabe? - perguntei, olhando para ele desesperada.
— Porque sou o advogado de defesa dela e recomendei que não desse entrevistas. Olhe lá
fora, ela está no meu carro - disse ele, tranqüilamente.
Olhei para o carro. Elena Rossini colocou a cabeça na janela e gritou com um sotaque
estrangeiro:
— Mark, desculpe: pode trazer chocolate Dairy Box em vez de balas?
Só então nosso carro apareceu, com o câmera.
— Derek! - gritou o câmera pela janela. — Compre um Twix e uma barra de Lion, certo?
— Então onde você estava ontem à noite? - perguntou Mark Darcy.
— Fiquei esperando por você - disse eu entre dentes.
— Como? – Mas às oito e cinco eu toquei sua campainha vinte vezes.
— Ah, é que eu estava ... - expliquei, começando a entender. — ...secando o cabelo.
— Seu secador é possante?
— É, tem 1.600 volts, modelo Seleção Salões - expliquei orgulhosa. — Por quê?
— Talvez fosse bom comprar um secador mais silencioso ou começar a se arrumar um
pouco mais cedo. Bom, tudo certo - disse ele, rindo. — Chame o seu câmera, vou ver como
posso ajudá-la.
Ai, Deus. Que constrangedor. Sou uma besta completa.
21h. Não consigo acreditar: as coisas deram muito certo. Acabo de assistir à chamada do Boa
tarde! pela quinta vez. Diz assim:
— Exclusivo para o Boa tarde! Este é o único programa de tevê a mostrar uma entrevista
com Elena Rossini, minutos após ela ter sido inocentada no julgamento. Nossa
correspondente no local, Bridget Jones, tem as notícias exclusivas para você.
Adoro este trecho:
— Nossa correspondente no local, Bridget Jones, tem as notícias exclusivas para você.
Vou assistir a só mais uma vez, depois desligo.

SEXTA-FEIRA, 6 DE OUTUBRO

57kg (comer reconforta), 6 unidades alcoólicas (problemas com álcool), 6 bilhetes de loteria
(jogar dá segurança), 21 ligações para o 1471 para ver se Mark Darcy ligou (apenas por
curiosidade, claro), número de vezes que assisti ao vídeo: 9 (melhorou).

21h. Argh. Deixei um recado na secretária. eletrônica. De mamãe ontem para contar do furo
jornalístico que dei, e quando ela me ligou à noite, achei que era para me parabenizar. Não,
era para comentar da festa. Una e Geoffrey disseram isso, Brian e Mavis fizeram tal coisa,
Mark estava tão simpático e por que eu não falava com ele etc., etc. Tive uma vontade enorme
de contar para ela o que tinha acontecido, mas me contive ao imaginar as conseqüências: um
grito e alegria ao saber do convite para sair com ele e o brutal assassinato da filha única
depois de saber o que houve.
Continuo com a esperança de que ele me ligue e marque outro encontro depois do fiasco
do secador. Talvez fosse bom eu mandar um cartão agradecendo à entrevista e lastimando que
o meu secador seja tão barulhento. Não que eu esteja interessada nele nem nada. Trata-se
apenas de um gesto de boa educação.

QUINTA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO

57,6 quilos (ruim), 3 unidades alcoólicas (tão saudável quanto normal), 13 cigarros, 17
unidades de gordura (fiquei pensando se é possível calcular as unidades de gordura no corpo
inteiro. Espero que não), 3 bilhetes de loteria (ótimo), 12 ligações para o 1471 para ver se
Mark Darcy ligou (melhor).

Argh. Elogiada por um artigo no jornal por uma repórter do grupo dos Bem-Casados. O título
tinha uma ironia sutil, estilo Frankie Howard: "As alegrias de ser solteiro."
"Eles são jovens, ambiciosos e ricos, mas suas vidas escondem uma dolorosa solidão. (...)
Quando saem do trabalho, enfrentam uma enorme carência emocional. (...) Pessoas que têm
uma vida solitária procuram consolo em comida enlatada, desejando que seja igual àquela que
suas mães faziam."
Argh. Droga. Pode me informar como é que a Sra. Bem-Casada aos 22 anos pode saber
disso?
Vou escrever um artigo baseado nas "dezenas de conversas" que tive com os Bem-
Casados: "Quando saem do trabalho, elas caem aos prantos porque, apesar de exaustas,
precisam descascar batatas e lavar toda a roupa na máquina enquanto seus maridos barrigudos
e bêbados assistem ao jogo de futebol na tevê, dão um arroto e pedem mais um prato de batata
frita. Há noites em que elas, na cozinha com seu aventalzinho chinfrim, ficam muito
deprimidas porque o marido ligou avisando que está de plantão outra vez, mas elas escutam
ao fundo o farfalhar de um vestido de seda e a voz sensual de uma típica Solteira."
Depois do trabalho, fui encontrar com Sharon, Jude e Tom. Ele também estava pensando,
em escrever um artigo irritado sobre as carências emocionais dos Bem-Casados.
O artigo de Tom diria, inflamado: "Os casados influenciam tudo, desde o tipo de moradia
que se constrói ao tipo de comida que enche as prateleiras dos supermercados. Vemos por
todos os lados lojas Anne Summers oferecendo artigos para donas-de-casa tentando de forma
patética simular o sexo excitante praticado pelos Solteiros e as lojas Mark and Spencer têm
comidas cada vez mais exóticas para casais exaustos fingirem que estão em um maravilhoso
restaurante como os Solteiros e que depois não precisam lavar a louça".
— Não agüento mais essa queda-de-braço a respeito de ser solteira! - rosnou Sharon.
— Eu também não, eu também não! - concordei.
— Você esqueceu de falar na babaquice emocional - acrescentou Jude. — Sempre há
babaquice emocional.
— Mas não estamos sós. Temos nossa família extensa formada pela rede de amigos com
quem falamos ao telefone - disse Tom.
— Isso mesmo, viva! Os Solteiros não deviam ser obrigados a se explicar o tempo todo,
deviam ter um status adquirido, como as gueixas - falei, muito satisfeita, dando mais um gole
no meu Chardonnay chileno.
— Gueixas? - perguntou Sharon, fazendo um olhar gélido.
— Fique quieta, Bridge - mandou Tom. — Você está bêbada. Está tentando afogar sua
carência emocional na bebida.
— Bom, a Sharon também - falei.
— Não estou - disse Sharon.
— Tássim - insisti.
— Escutaqui - aparteou Jude. — Vampdimasum Chardonnay?

SEXTA-FEIRA, 13 DE OUTUBRO

58,5kg (me transformei num barrilzinho de vinho), 0 unidade alcoólica (mas me alimento do
barrilzinho), 0 caloria*

*Devo ser honesta quanto a esse detalhe. O conceito m. b. está errado: 5. 876 calorias foram
vomitadas pouco depois de ingeridas.
Ai, Deus, estou tão sozinha. Passei o fim de semana inteiro sem ter ninguém para amar ou
com quem me divertir. Não tem importância. Comprei um delicioso pudim de gengibre na
M&S e vou prepará-lo no microondas.

DOMINGO, 15 DE OUTUBRO

57kg (melhor), 5 unidades alcoólicas (mas numa ocasião especial), 16 cigarros, 2.456
calorias, 245 minutos pensando no Sr. Darcy.

8h55. Dei uma saidinha para comprar cigarros antes de me preparar para assistir à adaptação
do livro Orgulho e preconceito na BBC. É incrível como as ruas estão cheias de carros. Será
que essas pessoas não deviam estar em casa se preparando para ver o programa? Acho ótimo
que o país seja tão viciado em tevê. A razão do meu vício, eu sei, é que sinto uma necessidade
humana de que Darcy durma com Elizabeth. Tom contou que o guru de futebol Nick Hornby
diz em seu livro que não é por acaso que os homens têm mania por futebol. Hornby afirma
que os fãs cheios do hormônio sexual masculino testosterona não querem jogar, mas sim
considerar o time como representante deles, como os membros do Parlamento. Elizabeth e
Darcy são meus representantes na área do amasso, ou melhor, do galanteio. Nem por isso eu
faço questão de vê-los marcando gols: detestaria ver Darcy e Elizabeth na cama, fumando um
cigarro depois de transarem. Seria errado e pouco natural e eu logo perderia o interesse pela
história.
10h30. Jude acaba de ligar e passamos 20 minutos falando "Uau, aquele Sr. Darcy". Adoro o
jeito dele falar, como se ele não pudesse ser interrompido. Uau! Depois ficamos horas
discutindo as qualidades do Sr. Darcy em relação a Mark Darcy e concordamos que o Sr.
Darcy era mais atraente porque era mais rude mas, como se trata de um personagem, era uma
desvantagem intransponível.

SEGUNDA-FEIRA, 23 DE OUTUBRO

58kg, 0 unidade alcoólica (m.b. Descobri um ótimo substituto para as bebidas alcoólicas: um
refrigerante chamado Smoothies, mto gostoso, com sabor de fruta), 0 cigarro (Smoothies tira
a vontade de fumar), 22 Smoothies, 4.265 calorias (das quais 4.135 por causa de Smoothies).

Argh. Vou assistir agora ao programa Panorama, sobre "Mulheres de ótimo nível,
independentes, que conseguem todos os melhores empregos" (peço ao Senhor que está no céu
e a todos os anjos que eu logo vire uma delas). A pergunta a ser discutida é: "Reformar o
currículo educacional será a solução?" Foi aí que bati o olho numa foto de Darcy e Elizabeth
abraçadinhos no Standard: horrorosos, vestidos como namorados modernos abraçados num
gramado: ela num conjunto de malha; ele, de camisa pólo, jaqueta de couro e com um bigode
fininho. Pelo jeito, já estão dormindo juntos. Que coisa mais desagradável. Fico me sentindo
perdida e preocupada, pois certamente o Sr. Darcy do livro jamais seria um ator, coisa tão
inútil e frívola, mas o fato é que ele é ator. Humm. Tudo mto confuso.

TERÇA-FEIRA, 24 DE OUTUBRO

58,5kg (malditos Smoothies), 0 unidade alcoólica, 0 cigarro, 32 Smoothies
Estou numa fase ótima no trabalho. Desde a entrevista com Elena Qualquercoisa, acho que
não dei mais nenhum fora.

Quando entrei na redação, Richard Finch estava de punhos fechados como um boxeador,
dizendo:
— Vamos! Vamos! Rosemary West!
Cheguei um pouco atrasada, é verdade, mas isso é o tipo da coisa que pode acontecer com
qualquer um.
— Estou pensando em vítimas de estupro que são lésbicas. Estou pensando na escritora
Jeanette Winterson. Estou pensando no Boa tarde! Estou pensando em como é que as lésbicas
transam. Isso mesmo! O que as lésbicas fazem na cama?
De repente, ele me olhou.
— Você sabe? - Todo mundo olhou também. — Vamos, Bridget-atrasada-outra-vez -
gritou, nervoso. — O que as lésbicas fazem na cama?
Tomei fôlego e disse:
— Acho que devíamos fazer uma reportagem sobre o romance na vida real de Darcy e
Elizabeth.
Ele me olhou de cima a baixo, devagar.
— Excelente idéia, excelente. Quem são os atores que interpretam Darcy e Elizabeth?
Vamos, vamos - disse, terminando com a reunião.
— Os atores são Colin Firth e Jennifer Ehle - acrescentei.
— Você, minha querida - disse ele, olhando para um dos meus peitos -, é simplesmente um
gênio.
Sempre quis virar gênio um dia, mas nunca pensei que fosse acontecer comigo - ou com
meu peito esquerdo.

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